Colaboramos com O Jardim Vulcânico La Lupa (Horto e viveiro) de recuperação de sementes ancestrais de vegetais)
O cineasta mais envolvido com a agricultura natural nos últimos anos está trabalhando em seu último filme, The Last Worlds, que foi filmado em cinco partes diferentes entre Europa e Ásia.
Mesmo assim, não vou falar desse filme, mas de seu projeto mais natural: um projeto de vida no qual estou feliz de ter podido colaborar.
Neste início de mês, tive a oportunidade de participar em um projeto único nas colinas que dominam o lago de Bolsena, no limite entre o Alto Lácio, Úmbria e Toscana, coração da civilização etrusca, destacada (não apenas por sua capacidade militar) entre os povos antigos também por sua afinidade com a agricultura, o artesanato, a arte e a riqueza de seus intercâmbios com todos os povos do Mediterrâneo.
Este projeto é tão maravilhoso quanto simples: Jonathan Nossiter, escritor, agricultor e cineasta (reconhecido mundialmente por dirigir Mondovino (2004) e Resistência Natural (2014)) e Massimiliano Petrini, professor e agricultor em permacultura, artesão e pescador de Bolsena, buscam recuperar e dar vida aos vegetais e frutos ancestrais ecológicos de diversas origens, que os agricultores insurrecionais trouxeram nos últimos anos ao vinho natural e aos grãos antigos.
Jonathan Nossiter: Nasceu nos Estados Unidos em 1961, mas cresceu em Paris. Estudou artes plásticas na Europa, antes de se dedicar ao teatro e cinema. Gosto e poder (2009) foi seu primeiro livro, escrito a partir da filmagem de seu documentário Mondovino (2004). Rodou Resident Alien (1991), Sunday (1997), Sinais e Maravilhas (2000), e em 2008 produziu o documentário de Paula Prandini, Il Vino Inmigrante, sobre a problemática do vinho natural no Brasil. Entre outras coisas é sommelier em Nova York, Paris, Rio de Janeiro, porém seu amor pela terra e o ressurgimento da agricultura natural o levou a instalar-se em Bolsena no mesmo ano e a criar esse projeto.
Sempre envolvido em causas a favor da agricultura livre de químicos, Jonathan é um rebelde defensor do vinho natural, sem chegar ao radicalismo, opina que a agricultura natural e biodinâmica é a única esperança para reverter o desastre que se criou no último século.
O ato de agricultura: o agricultor que aprende a trabalhar sem a dependência da indústria agroquímica e ultrapassa esse conhecimento.
O Jardim Vulcânico La Lupa se estende em terras jamais tocadas pela química à beira do Lago de Bolsena, onde Jonathan encontrou um terreno abandonado por trinta anos e que anteriormente se cultivou de forma natural, no que podemos dizer então que é um terreno fértil e limpo de produtos sintéticos, onde se reunirá a riqueza da história da horticultura do centro italiano e ao mesmo tempo a oportunidade de fazer uma viagem através de outras regiões, outros países, através da diversidade de seus vegetais ancestrais.
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Em uma estufa instalada muito perto do sítio fomos convidadas para colocar nosso grão de areia plantando sementes que foram procuradas e compartilhadas por bancos de sementes de distintas universidades da Itália, por agricultores ecológicos/biodinâmicos e por vinicultores de vinho natural ao redor do mundo; e um campo aberto com vista para o lago plantamos árvores hortícolas provenientes de sementes antigas; sementes vivas, não hibridadas pela indústria agroquímica.
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Assim, entre amigos, começamos esse ano de cultivos, entre eles pioneiros da agricultura natural na Itália. Stefano Belloti, de Casina degli Ulivi, fundador e presidente de Renassaince des Appelations Italia, Giovanna Tiezzi e Stefano Borsa, de Pacina, conhecidos mundialmente por sua agricultura natural e seus vinhos biodinâmicos e naturais. Enzio Cerruti, professor de moscato livre em Piemonte, Mina del Prete, vinicultora natural pugliesa, Juan Pelizzotti, vinicultor biodinâmico argentino e demais pessoas que foram e vieram antes e depois de minha chegada.
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Todos colaboramos com sementes e no meu caso, tive a honra de trazer comigo sementes de espécies antigas catalãs que me foram cedidas por Joan Salicru Giralt, respeitado agricultor biodinâmico catalão que ao ouvir sobre o projeto, não hesitou em me doar suas melhores sementes.
Entre estas sementes livres de química, puras e biodinâmicas se encontravam: feijão baixo, feijão de ramo alto, fava comum, fava de amora rainha, ervilhas de vagens comestíveis e uma espécie de arroz antigo que Joan criou para consumo humano e animal. Todas elas sementes ecológicas.
Existem excelentes redes de intercâmbio e bancos de sementes ao redor do mundo, dedicadas a salvaguardar a biodiversidade hortícola, mas em troca há muito poucas realidades de cultivo de sementes antigas que também se ocupem de sua transformação em viveiros de plantas hortícolas. No viveiro La Lupa haverá uma dupla cultura. Por um lado, um museu ao vivo, uma implementação da memória histórica da horticultura italiana e de outros países e por outro, uma entidade agrícola que oferecerá a todos a oportunidade de povoar os campos de plantas provenientes de sementes que não foram tocadas pela indústria agroquímica. De fato, inclusive na grande maioria dos viveiros de vegetais orgânicos, as plantas “eco” provém de sementes híbridas ou geneticamente manipuladas. Para que serve a agricultura orgânica se a origem já é antibiótica?
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La Lupa tratará de seguir no espírito da obra de Jean-François Berthelott, que cresce no sudoeste da França, onde se encontra o museu vivo do grão – um campo experimental em que cresce a cada ano 300 variedades de grãos antigos recuperados durante quarenta anos de investigação. Por exemplo, em La Lupa, a classificação não se fará pela variedade de espécie, mas pela região à qual ela pertence. Dessa maneira as relações entre as hortaliças e as variedades autóctones será considerada em um contexto principalmente regional, no que as regiões não são as divisões administrativas, mas as diversidades culturais e agrícolas.
Foram três dias intensos, uma experiência extraordinária a de compartilhar uns dias com amigos e gente que se mobilizou de diferentes partes do mundo para plantar um bosque único e compartilhar um mesmo sentimento, o que aconteceu enquanto eu passei por vinhos sãos espalhados em uma mesa plena, sorrisos, experiência de vida, espontaneidade e rebelião.
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Dada a ambiguidade científica do que se pode chamar “semente ancestral”, “antiga” ou “autêntica”, se fizeram cartazes para reconhecer o trabalho de todos os agricultores, pessoas, institutos ou universidades que proporcionaram ou atuaram como condutores para transmitir essas sementes ancestrais, que foram colocadas no lugar da plantação, no viveiro e nos cartazes ao lado de cada seção de variedade de cada planta.
Nas palavras de Jonathan:
“Estas sementes contarão histórias humanas, culturais e históricas: altamente pessoais e subjetivas, cada planta trará a história dessas pessoas uma autenticidade elástica e democrática. O aspecto da transmissão entre as pessoas é parte da beleza do patrimônio cultural de cada vegetal, a agricultura natural é uma expressão cultural, é rebelião e é vida.”
No sábado, 28/04, terá lugar a inauguração do Viveiro Vulcânico La Lupa, onde poderão ser adquiridos os primeiros brotos e plantas. Se dará uma festa com os vinhos de Ajolá e os melhores queijos do Secondo Alto Piano.